Nosso escritório atuou em causa, onde fomos procurados por uma imobiliária, que, ao formular o contrato de locação, face a falta de fiador, aceitou imóvel do locatário por ele oferecido em caução Real da Locação, inclusive com registro da garantia efetivado junto a matrícula do imóvel dado em Caução.
A discussão judicial surgiu quando o Locatário deixou de pagar os aluguéis devidos e foi necessária a Execução do débito deixado por ele. Diante da Caução Real, devidamente registrada na matricula do imóvel, foi então requerida a penhora do imóvel dado como garantia do pagamento das obrigações decorrentes da locação.
Realizada a penhora, o Locatário passou a Embargar a Execução sob alegação de quer o imóvel não poderia objeto de penhora pois se tratava de único imóvel e por ser a residência de sua família, o imóvel era de bem de família.
Em impugnação ofertada pelo nosso escritório, sustentamos a posição de que a alegação de bem de família não poderia ser suscitada, eis que o imóvel foi ofertado pelo próprio Inquilino como garantia Real, e que essa oferta implicava na renúncia a eventual direito de alegação de bem de família.
A decisão de primeira instância acolheu a tese ofertada pelo nosso escritório e manteve a penhora, esse é o resumo da decisão (Processo 1001205-52.2014.8.26.0068 da 5ª Vara Cível de Barueri):
“Aplicar-se-ia a ele a impenhorabilidade do bem de família. Todavia, fato é que o imóvel foi dado em caução em contrato de locação, e será levado a leilão nos autos de processo que tramita na 4ª Vara Cível local. E porque o próprio executado o deu em caução, abrindo mão de sua impenhorabilidade, não pode se opor a que tal bem seja vendido em hasta pública. Não pode se opor à penhora do bem que ele próprio concordou entregar em garantia de outra dívida. Em consequência, possível que o crédito do exequente seja também satisfeito com a alienação do bem. É certo que o imóvel está penhorado em virtude de diversas dívidas conforme se vê a partir de fls.158/162, sequer sendo possível saber se será suficiente para a satisfação de todos os credores. Em razão do exposto, não se pode acolher a tese da impenhorabilidade, ainda que o imóvel seja o único imóvel do executado e que seja utilizado como residência sua e de sua família. Ante o exposto, recebo os presentes embargos como impugnação ao cumprimento de sentença, e rejeito-a, mantendo a penhora efetuada.”
Não satisfeito com a decisão o inquilino recorreu da decisão para a segunda Instância, cujo acórdão manteve a decisão de primeira instância (Agravo de Instrumento 2031384-25.2015.8.26.0000 – TJSP):
“No mais, como já asseverado pelo culto Juiz presidente do feito, o imóvel que acolhe a família do agravante foi oferecido em caução pelo próprio executado, como se vê no contrato de locação, às fls. 226 deste instrumento, e, tendo indicado o bem como garantia contratual, renunciou, pois, à impenhorabilidade do bem de família que alega estar imbuído no imóvel. Consta expressamente na cláusula 14ª do contrato que “os locatários dão em garantia por caução ao locador, os direitos, vantagens e obrigações decorrentes do instrumento particular de Cessão celebrado em 25/05/1983, devidamente registrado junto a matrícula nº 44292 R. 03 em 30/11/1983 no Cartório de Registro de Imóveis a proceder a devida averbação na referida matrícula, vinculando-o a este contrato, ainda que pese sobre o referido imóvel, processos de penhora, arrestos e sequestros, de ciência do locador” fls. 226 do presente. A diferenciação entre os institutos da fiança e da caução em nada obsta a penhora do imóvel do agravante, confessadamente por ele ofertado como garantia do contrato de locação, respondendo, portanto, pela dívida oriunda do referido trato locatício.”
Insatisfeito com a decisão do Tribunal o Inquilino interpôs Recurso Especial, dirigido ao STJ, inicialmente o recurso especial teve o seu seguimento negado, mas por conta agravo o recurso acabou sendo analisado pelo STJ.
Em decisão que contrariou todas as instâncias inferiores, o STJ entendeu ser possível a alegação de bem de família, mesmo na hipótese do referido bem ter sido oferecido como Caução Real para garantia de obrigações decorrente de contrato de locação.
AREsp nº 866399 / SP (2016/0039724-8) autuado em 04/03/2016
“Nessa linha de entendimento, esta Corte Superior tem decidido que, “em se tratando de caução, em contratos de locação, não há que se falar na possibilidade de penhora do imóvel residencial familiar” (AgRg no REsp 1.334.693/SP, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 25/6/2013, DJe de 1º/8/2013).
Nesse mesmo sentido: AgRg no Ag 1.153.724/SP, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em 2/3/2010, DJe de 29/3/2010.
No caso em exame, o agravante não assinou o contrato de locação na qualidade de fiador, mas de “caucionante”. A circunstância de ter oferecido em garantia bem de família não produz efeito capaz de afastar a proteção assegurada pela Lei nº 8.009/1990, de modo que deve ser afastada a constrição que recaiu sobre o imóvel.
Ante o exposto, conheço do agravo para dar provimento ao recurso especial a fim de julgar procedente o pedido formulado para desconstituir a penhora que recaiu sobre o bem de família do agravante.“
CONCLUSÃO
No caso ora citado, não foi nosso escritório que prestou assessoria na formulação do contrato de locação, apenas fomos contratados para executar a dívida.
Ocorre que a Garantia real em imóvel, no caso de contrato de locação, pode ser uma alternativa eficaz para garantir as obrigações decorrentes deste contrato, sem depender de terceiros (Fiadores), hoje muito difícil de ser encontrado pelos pretensos Locatários, bem como se mostra uma alternativa mais barata do que o seguro fiança cujo custo é elevado.
Nada obstante, diante do entendimento do STJ, entendemos que, para a segurança da oferta de caução Real em Imóvel, no caso de Locação, é necessário fazer constar no contrato de locação, onde a oferta está sendo feita, de que o Caucionante declara que o imóvel oferecido não se trata de único imóvel, bem como não se trata de imóvel de residência de sua família. Não é só, para que se tenha segurança é necessário a indicação do número da matricula dos outros imóveis de propriedade e ainda a especificação do número da matricula do imóvel que o caucionante indica como sendo imóvel de residência dele e da família, anexando ao contrato as matriculas atualizadas na data da assinatura do contrato.
Tudo isso, porque, em consonância com a jurisprudência do STJ “a indicação do bem de família à penhora não implica em renúncia ao benefício conferido pela Lei 8.009 /90, máxime por tratar-se de norma cogente que contém princípio de ordem pública.
Essas sugestões, não garantem 100% da eficácia e solução do problema encontrado no posicionamento do STJ, mas, com certeza, acabam fornecendo elementos ao órgão julgador da má-fé ou deslealdade do Caucionante, que podem mudar esse entendimento, dado a particularidade acrescida ao contrato
Esperamos que o presente artigo possa contribuir de alguma forma, com eventuais operadores do direito que se deparem com questão semelhante.